aforismos coreográficos
sɐɔıɟósolıɟ sǝõçɔıɟ
não há nada de novo aqui, fiquem tranquilos. Apenas alguém organizando pensamentos íntimos já pensados por outros.
isso é preciso.
sempre partimos de uma ficção.
a que proponho é que exista algo que se chama dança e outro algo que se chama coreografia.
e desejo aqui que estas coisas aconteçam para que eu acredite nelas.
uma ficção em que se acredite chamamos de realidade.
pensar a dança ontológicamente afim de fazê-la acontecer enquanto arte, tirá-la do ambito estético-decorativo (lembremos aqui da distinção que Joseph Kosuth faz entre arte e estética em sua arte depois da filosofia).
a dança até agora foi pouco mais que uma decoração do espaço no tempo, quando sua mais íntima potência está em criar o espaçotempo.
na coreografia encontramos a possibilidade da dança pensar-com-arte. a possibilidade da Dança acontecer.
sua propriedade é coreográfica, no sentido daquilo que lhe possibilita ser. sua ontologia.
a dança cênica como a conhecemos, ainda não se apropriou de si, do que lhe é próprio.
ainda não existe em sua dignidade. está longe de ser ética.
não necessariamente há dança em uma coreografia, ou coreografia em uma dança. são coisas completamente distintas, que podem ou não se aproximar.
não pretendo criar definições de dança e coreografia, mas não garanto que não acabe me aproximando de um conceito, mesmo que em baixa definição.
não existe uma gramática na dança, nem uma língua.
o serumanus (DaSein) está desde sempre separado da linguagem
lançado ao mundo
ele habita esta fratura entre viver e falar
mudo, destinado a falar
a falhar
a coreografia cria o espaço e o tempo em uma mesma trama.
cada sociedade cria suas ficções sobre o mundo. seus ditos sobre o curso (fluxo contínuo), seus discursos.
seus modos de pensar o mundo e os acontecimentos.
por serem discursos extraídos do mundo, dizem o acontecer deste.
por dizerem o acontecer do mundo, fazem o mundo acontecer.
por fazer o mundo acontecer, acreditamos na ficção.
por acreditarmos na ficção, chamamos-lá de realidade.
uma ficção engendra acontecimentos inesperados.
podemos pensar nas pirâmides do Antigo Egito como acontecimentos de uma ficção muito específica.
uma ficção que falava de deuses-animais, deuses-homens, faraós, mumificações, que elaborava um modo muito próprio de relacionar-se com a morte.
jamais tocaremos naquela ficção, temos seus vestígios, seus rastros,
mas nossa leitura está condenada por nossa língua, por nossas atuais ficções.
as pirâmides estão lá, e preservam o mistério do seu acontecimento.
mistério esse que nenhuma de nossas ficções poderá tocar.
o máximo que podemos, é criar novas ficções sobre elas.
Do mesmo modo
nossa ciências contemporâneas são discursos sobre o mundo, outras ficções em meio a tantas outras.
ficções muito específicas em seu modo de se aproximar do mundo, em suas matemáticas, em suas hipóteses, em suas crenças.
ficções estas que engendram acontecimentos inesperados, como computadores, viagens espaciais, teletransporte de partículas subatômicas, aceleradores de partículas.
por vermos estas ficções funcionando, acreditamos nelas.
uma ficção em que se acredite, chamamos de realidade.
todo discurso é ficcional pelo simples fato de ser discurso,
seja ele matemático, poético, esotérico, religioso, jurídico, etc
cada ficção trás consigo consequencias ontológicas,
uma postura no mundo, um modo de existência, um modo de pensar,
que por si só
já são
ação no mundo
a realidade instituída é metafísica, pois esqueceu-se que é ficção, se julga verdade.
(metafísica diz o esquecimento do esquecimento do ser)
física aqui, diz φυσις, o movimento do nada ao rútilo, o ser da coisa, o movimento de insurgencia de uma existencia. o verbo.
é preciso pensarmos uma ética da ficção
quais as consequencias ontológicas de um pensamento?
ser é diferente de existir. eu sou mas não existo.
o desejo de uma existência em vida é criar um corpo para si.
nascemos sem corpo e inexistentes.
temos a sensação de que existimos por compartilhamos da mesma substância de todas as coisas que são. nós somos, mas não existimos. existir é nosso animo em vida.
cada existência pode desdobrar-se enquanto uma realidade única. um ponto de luminância. "Gente é para brilhar".
se fazer realidade, é o mínimo que uma existência pode fazer por si, pelo outro. sua dignidade.
a realidade não está dada, ela é algo a ser.
um corpo tecido por infinitas linhas.
um corpo está sempre se fazendo na colisão de específicos discursos que mesmo colidindo jamais se tornam o mesmo. a diferença reina e se faz presente.
o corpo
uma arquitetura impossível
o mundo é pura linguagem
por isso mudo
o serumanus
estranho ao mundo
pode
e tem por responsabilidade ética
dizê-lo
a palavra se faz conceito, ideia, pelo seu uso.
Não poderia tentar aqui definir a palavra coreografia.
Mas usá-la de tal forma que uma outra ideia de coreografia possa emergir destas texturas.
a palavra coreografia, por si, diz pouco. pouco mais que uma grafia da choreo.
choreo que remete às danças corais da grécia antiga
(procurarei dados mais precisos disso,
as informações etimológicas dessa palavra sempre soam insuficientes para se pensar alguma coisa)
uma escritura, um discurso dos movimentos dos corpos.
se me dou a liberdade de usar a palavra coreografia
e pior
se me proponho a pensá-la e assim explodí-la
é simplesmente por acreditar que há nela
a possibilidade da dança fundar alguma linguagem,
se fazer eticamente.
existir a partir de sua existência.
arquitetura, coreografia primeira.
há sempre uma arquitetura antes do corpo.
a arquitetura organiza os fluxos do movimento em espaço e tempo. a arquitetura coreografa.
há sempre uma coreografia anterior à dança. se quisermos criar outro espaçotempo, precisaremos levar esta arké em consideração.
- o espaço não é um existente por si. ele passa a ter existência no momento em que as coisas existem. estamos dentro de uma sala de teatro. tire as cadeiras. tire os refletores. tire a cabine de som e luz. tire o teto. tire as paredes da sala. aquele espaço-teatro já não existe mais. tire tudo. há espaço?
- mas tira e põe aonde?
se a intenção do coreógrafo não for um eco da intenção da coreografia, seu gesto não passará de ato de violência. a coreografia coreografa.

o espaço e o tempo não são categorias ontológicas.
dança é uma coisa, coreografia é outra.
um dançarino não necessariamente coreografa.
o coreógrafo não necessariamente dança.
não existe UMA realidade que seja comum a todos os existentes.
o que partilhamos é a existência, somos todos existentes, mas cada existência engendra sua própria realidade.
11. somos todos manifestação de uma mesma substância.


12. ser é compartilhar de uma mesma substância com tudo aquilo que existe.


13. o serumanus nasce sem corpo. precisa poetar seu próprio corpo.


14. um corpo se fazendo virtualiza uma possível dança. o acontecimento deste corpo se faz em dança.


15. dança não é espontaneidade.


16. compreendo uma coisa quando entro em ressonância com ela.


17. nascemos sem corpo.

a dança pode ser o acontecimento do corpo. ou o acontecimento da coreografia.
nada garante que uma coreografia aconteça enquanto dança.
nada garante que um corpo aconteça como dança.

18.
a substância é o desdobramento da matéria que é vibração e assim energia.


foi no cinema que o pensamento coreográfico foi mais longe.
o cinema pôde pensar o movimento com uma radicalidade jamais vista. criando inúmeros tempos espaços de qualidades texturas densidades coloridos tão ricos quanto diversos.
nos planos sequencia, o encadeamento dos movimentos em se fazendo, a luz deslizando continuamente pela tela sem interrupção,a coisa se de-morando no olhar, cria um tempo espaço únicos, que nenhuma coreografia em cena tenha alcançado.
mas nada garante que um plano sequencia seja uma coreografia.


a coreografia é o que há de particular naquilo que comumente chamamos de Dança, mas não necessariamente há dança em uma coreografia, ou coreografia em uma dança. são coisas completamente distintas, mas que podem se aproximar. não pretendo aqui criar definições de dança e coreografia, mas não garanto que não acabe criando algum tipo de definição.
18. a dança ainda não existe enquanto arte.
19. para pensar a coreografia é preciso abandonar o corpo.
20. a linguagem não existe
21. o tempo não existe
22. o corpo não existe
23. o espaço não existe
24. as coisas existem
25. a organização de uma dança não necessariamente se dá coreograficamente.
26. na dança a materialidade da obra se confunde com a materialidade do poeta.
27. cada corpo é uma possibilidade de dança.
29. até agora, a dança ocupou-se principalmente, em se afirmar pela pesquisa de movimento,
30. em uma coreografia, pode-se usar corpos domesticados ou não, corpos ou não ou coisas apenas. ou palavras ou sons. é possível coreografar qualquer coisa.
31. a dança, não tem, necessariamente a ver com o corpo, mas com a existência. uma ética.
32. um acontecimento em dança. um encontro entre uma drag queen decadente e um fauno demoniaco com um falo de prata.
33. quando erramos a coreografia a dança acontece.
...calma calma calma...
coreografia, diz escritura da dança, mas córeo diz dança?
estruturação do movimento
organização do movimento
poderia usar a palavra dramaturgia
mas é preciso pensar a dança com alguma propriedade para que ela possa estar em relação e ganhar existência.
toda elaboração é discursiva
a realidade é discursiva enquanto ficção
o mundo nunca mudou - o fato das coisas existirem
a realidade é o discurso que se cria a partir deste espanto com a existência das coisas
esse discurso é uma criação ficcional que diz do movimento das coisas
do acontecimento das coisas
"Ela se situa em um ponto de coincidência entre diacronia e sincronia, no qual, como estado da língua não atestado historicamente, como 'língua jamais falada' e , todavia, real, ela garante a inteligibilidade da história linguística e, simultaneamente, a coerência sincrônica do sistema." Agamben, Infancia e história.
a necessidade de criar uma ficção para que se possa pensar para além do instituído.
"se não houvesse a experiencia, se não houvesse uma infancia do homem, certamente a língua seria um <>, cuja verdade coincidiria com o sei uso correto segundo regras lógico-gramaticais"





a arquitetura, coreografia primeira

no banho, penso. antes da torta, escrevo:
-
- e o projeto?
- os possíveis caminhos que não sejam nem impor o projeto, nem abandoná-lo.



7. o espaço e o tempo não são categorias ontológicas.








pós seleção (pós apagamento) algumas anotações para mim (mim?):
a coreografia enquanto o movimento de Eu a Tu, mas acima de tudo, o movimento da despedida
ver principalmente minuto 11'42''


a imagem está na poesia, por vezes na literatura, na filosofia. Há pouco de imagem onde mais se usa a palavra imagem: no cinema, na dança.
a imagem é uma construção mental que surge da tensão entre realidades, palavras, ideias.
ao invés de explicar, colocar o link do filme jlg/jlg
achei o link, cá está. grifo nosso no 2ºminuto:




a poesia poeta a imagem

fazer das coisas verbo
verbalizar os verbos

apenas as coisas agem, não os sujeitos, e nem por isso eles são passivos
não há passividade se não houver atividade?
deixar a coisa acontecer, isso é ação, a pura ação, a intensão está na coisa, não no sujeito, não há expressão de uma subjetividade, mas o acontecer de uma coisa.
os sujeitos estão eternamente condenados a serem arrastados pelas coisas em suas coisações

a coreografia coreografa

como pode existir coreografia hoje?

logos/ kosmos
organização necessária dos movimentos do caos

pensar dança: dançar
o pensamento da coisa como coisação da existência engajada no pensamento

insonia:
não existe linguagem
ela acontece
não podemos confundir a linguagem com a gramática
a linguagem acontece no acontecimento da coisa
ao acontecimento da coisa chamamos de dança

um nó: a dança cria a música, porém a música engendra a realidade ontológica da dança.

outros pensares:
uma sequencia de movimentos encadeados não necessariamente resulta em uma coreografia nem em uma dança.
quando a coreografia acontece?

a história da dança considerada cênica, enquanto arte emancipada, confunde-se com a história da domesticação do corpo da corte.
o que é próprio da dança? o que faz com que ela não se confunda com uma pintura? com o cinema? com o teatro? é possível pensarmos uma forma-dança? será que o que distingue não é o mesmo que permite a confusão?
sem a distinção não é possível a confusão.
Kosuth propõe pensarmos arte, sem regionalismos como pintura, escultura. é claro que ele está pensando principalmente nas artes pláticas quando diz isso, mas uma vez que ele se propõe a radicalizar o entendimento de arte, porque não ampliar este entendimento para qualquer manifestação artística?
autoprovocação:
em 1969 Kosuth disse: "ser um artista hoje (em 69, e hoje?) é questionar a natureza da arte. Se alguém está questionando a natureza da pintura, não pode estar questionando a natureza da arte. Se um artista aceita a pintura (ou a escultura), ele está aceitando a tradição que a acompanha. Isso porque a palavra arte é geral e a palavra pintura é específica. A pintura é um tipo de arte. Se você faz pinturas, já está aceitando (sem questionar) a natureza da arte. Nesse caso se aceita a natureza da arte como sendo a tradição européia de uma dicotomia pintura-escultura."
"a ideia de arte e a arte são o mesmo e podem ser apreciadas como arte sem que se saia do contexto da arte para a verificação."

aqui estou questionando a natureza da dança, e com isso me aproximo de um questionamento da arte (arte?)

"dizer que uma proposição geométrica é falsa, ou um sistema de proposições geométricas é falso, é dizer que ele é autocontraditório."
"uma proposição empírica, ou um sistema de proposições empíricas, é considerado falso, não porque é imperfeito formalmente, mas porque falha em satisfazer algum critério material."
A. J. Ayer sobre Kant

em meio a tudo isso como fica a poesia, cuja forma é seu significado?

um parentese a ser pensado em outro lugar. aproveito este como anotação. (assim como as formas lógicas e geométricas não estão isentas de subjetividade, também não o estão, as resoluções formais da arte conceitual)

a dança vem caminhando a ser dança, mas ainda não chegou a ser. se insinua, mas temerosa regride. se segura em ideias tradicionais do que ela possa ser e se impede de nascer.

pensando:
a dança pode ser o acontecimento do corpo. ou o acontecimento da coreografia. mas nada garante que uma coreografia aconteça enquanto dança. onde, a meu ver, houve uma maior elaboração do pensamento coreográfico foi no cinema, principalmente nos chamados planos sequencia, mas nada garante que um plano sequencia seja uma coreografia. a coreografia é o que há de particular naquilo que comumente chamamos de Dança, mas não necessariamente há dança em uma coreografia, ou coreografia em uma dança. são coisas completamente distintas, mas que podem se aproximar. não pretendo aqui criar definições de dança e coreografia, mas não garanto que não acabe criando algum tipo de definição.
o existir e o acontecimento do corpo
só há acontecimento corporal, pelo corpo e no corpo. o mero existir não nos garante um corpo, mesmo que tenhamos existencia material (toda existencia se dá pela matéria, que não se distingue de energia. questões de vibração/ questões de música) é preciso criar um corpo para si. isso é poesia. dar consistencia à própria existência. isso é uma das formas de dança. uma existência apropriar-se da materialidade que lhe é própria. Uma ética: criar um corpo para si. ethos anthropous daimon. todo corpo tem em si uma possibilidade singular de dança. a partir de seu traço, de sua figuração. é muito comum ver isso em cantores de bandas de rock. muito difícil ver isso onde se costumam chamar de dança. a sistematização de movimentos ou procedimentos para um corpo se mover (o que acostumamos chamar de técnicas de dança) não garante que haja dança. podemos aprender a nos mover bem, com inteligência, utilizando a força de uma forma equilibrada, ou tendo a liberdade de lidar com a força de diversas formas, mas dificilmente dançamos. é difícil aprender a dançar. é difícil ensinar a dançar. a música pode nos ensinar a dançar. ela é vibração e a matéria só é matéria porque vibra. não precisamos de música para dançar, é até bom que não haja, para que o acontecimento do corpo se mostre com maior força e não vire um adereço da música, sua ilustração.

o corpo acontece em movimento

as pessoas q

o pensar coreográfico
Andréia me falou da coreografia implícita no movimento, uma inteligência do movimento no espaço.
determinadas técnicas de dança já possuem em seu modo de pensar e articular o movimento, um pensamento coreográfico. organizar o movimento no espaço é coreografia? há um espaço a priori? um espaço abstrato? coreografia/ imagem-movimento/ imagem-tempo/ espaçotempo/ tempespaço...coisas a pensar
DANIEL FAGUS KAIROZ
COREO
GRAFIA